quinta-feira, 11 de junho de 2009

SABER VIVER É VENDER A ALMA AO DIABO . Gosto dos que não sabem viver, dos que se esquecem de comer a sopa («Allez-vous bientôt manger votre soupe, s... b... de marchand de nuages?») e embarcam na primeira nuvem para um reino sem pressa e sem dever. . Gosto dos que sonham enquanto o leite sobe, transborda e escorre, já rio no chão, e gosto de quem lhes segue o sonho e lhes margina o rio com árvores de papel. . Gosto de Ofélia ao sabor da corrente. . Contigo é que me entendo, piquena que te matas por amor a cada novo e infeliz amor e um dia morres mesmo em «grande parva, que ele há tanto homem!» . (Dá Veloso-o-Frecheiro um grande grito?..) . Gosto do Napoleão-dos-Manicómios, da Julieta-das-Trapeiras, do Tenório-dos-Bairros que passa fomeca mas não perde proa e parlapié... . Passarinheiros, também gosto de vocês! Será isso viver, vender canários que mais parecem sabonetes de limão, vender fuliginosos passarocos implumes? . Não é viver. É arte, lazeira, briol, poesia pura! Não faço (quem é parvo?) a apologia do mendigo; não me bandeio (que eu já vi esse filme...) com gerações perdidas. . Mas senta aqui, mendigo: vamos fazer um esparguete dos teus atacadores e comê-lo como as pessoas educadas, que não levantam o esparguete acima da cabeça nem o chupam como você, seu irrecuperável! . E tu, derradeira geração perdida, confia-me os teus sonhos de pureza e cai de borco, que eu chamo-te ao meio-dia... . Por que não põem cifrões em vez de cruzes nos túmulos desses rapazes desembarcados p'ra morrer? . Gosto deles assim, tão sem futuro, enquanto se anunciam boas perspectivas para o franco frrrrançais e os politichiens si habiles, si rusés, evitam mesmo a tempo a cornada fatal!
. Les portugueux... não pensam noutra coisa senão no arame, nos carcanhóis, na estilha, nos pintores, nas aflitas, no tojé, na grana, no tempero, nos marcolinos, nas fanfas, no balúrdio e ... sont toujours gueux, mas gosto deles só porque não querem apanhar as nozes... . Dizes tu: - Já começou, porém, a racionalização do trabalho. Direi eu: - Todavia o manguito será por muito tempo o mais económico dos gestos! . * . Saber viver é vender a alma ao diabo, a um diabo humanal, sem qualquer transcendência, a um diabo que não espreita a alma, mas o furo, a um satanazim que se dá por contente de te levar a ti, de escarnecer de mim... Alexandre O'Neill

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